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Nós, brasileiros, precisamos da sua inocência, Ronaldo, para afastar de uma vez por todas a figura nefasta do cartola do comando do nosso futebol. Vou dar o exemplo do meu time, o Fluminense, que só este ano já trocou de treinador três vezes. Lá, como em todos os clubes de futebol, o presidente vem do quadro social. Compra um título, faz amizade no tênis, se torna benemérito com a ajuda do pessoal da sauna e na piscina adquire os votos que estavam faltando para chegar à presidência. Sem entender nada da bola que rola, sai distribuindo desconhecimento por absoluta falta de grama, vestiários, competições. Peter Simens pode até ser presidente, desde que o seu vice de futebol seja o Delei. O Rubens Gálaxie. O Ricardo Gomes. E assim o Flamengo pode empossar o Junior, o Zé Mário e o Vasco o Ricardo Rocha ou o Mauro Galvão. Eles se tornam comentaristas, quando não são treinadores, mas são líderes naturais que poderiam comandar o futebol, como Gonçalves e Mendonça, no Botafogo, e deixar o presidente cuidar da compra do cloro. Do pagamento dos funcionários da secretaria. Como não é assim, criam asas, ganham jantares para eleger Rubens Lopes na FERJ e estes, já no comando de confederações, chefiam delegações em amistosos da seleção pelo mundo. Gratos, elegem o Marin na CBF e este vai a Zurich eleger os Blatters na FIFA. Pronto, está servido o farelo. Armada toda esta pocilga.
Mas para isto, Ronaldo, nós precisamos da sua inocência. Para ter moral de afastar os cartolas. Ser finalmente convocada uma CPI para apurar aquele imoral desembarque da delegação do penta, que trouxe na bagagem toneladas de produtos importados, passando por uma porta aberta pela alfândega, que empanou a conquista do penta. Para saber como o Tino Marcos consegue entrevista exclusiva para a TV Globo, nos jogos do Brasil, e as outras nem direito à transmissão das competições conseguem. E, finalmente, quanto foi pago neste jantar que transferiu os jogos para depois da novela, mudando uma cultura que permitia aos torcedores voltarem cedo para casa. Hoje, ele tem que sair dos estádios à meia noite, chegar as duas horas em Caxias e pegar um transporte da Super Via às 6hoo que eles, cartolas, jamais pegaram no começo da carreira para treinar. Então como enxergar? Como entender? Como não se corromper?
Mas para isto, Ronaldo, precisamos da sua inocência. Porque nenhum cartola é candidato a idolatria. Nenhuma criança quer ser cartola no esporte porque não são nem figurinhas. São incolecionáveis. Mas ao final desta história, são eles que destroem os seus sonhos. O garoto quer ser Ronaldinho Gaúcho, Zico, Gérson e Rivelino. Ele quer ser Ronaldo, o Fenômeno. Mas para isto, os ídolos precisam dar exemplos. Declarar que são diferentes. Inocentes. Incorruptíveis. Dignos de ter separado o trigo deste farelo que os porcos consumiram quando empanaram o brilho da nossa maior paixão.
José Roberto Padilha é jornalista, ex-atleta do Fluminense, Flamengo, Santa Cruz e Americano, entre outros.