Há uma fábula bem antiga, que conta a história de um beija-flor que carregava água no biquinho e a jogava num grande incêndio que destruía a floresta. Perguntado por que estava fazendo aquilo, em vão, ele respondeu: “estou fazendo a minha parte”. Assim é o Brasil de hoje. Uns fazem a sua parte, outros nem isso. O futebol não é diferente. Alguns procuram ajudar, estudam, orientam, sugerem, dão idéias. Outros nada fazem, pensam apenas em levar vantagem – não é o caso do Gerson, por favor – ou deixar como está.
Caso recente de fazer, e muito bem, por sinal, a sua parte, foi a entrevista com Paul Breitner realizada na ESPN. Uma aula de conhecimento, lucidez, simplicidade. Sem arrogância, prepotência, soberba. Resumindo: sabe o que está falando e mostra os caminhos. Um monumento à história, muito bem aproveitada pelo pessoal da ESPN. E não estou exagerando. Escrevi no dia seguinte ao programa, aqui no blog, e continua repercutindo até agora e por muito tempo, o que disse o extraordinário jogador, um dos monstros que vi atuar.
O que falta para que haja mudanças radicais no nosso futebol ? Tudo, a começar pela mídia, que vive o apogeu da mediocridade. Mais que isso, não há espaço para as pessoas que dizem o que pensam, o que veem, os politicamente incorretos. É vergonhoso assistir a determinadas resenhas esportivas na televisão, com gente manipulada, a maioria ex-jogadores, árbitros, jornalistas, uma pena. Pessoas que poderiam ser mais bem aproveitadas, contribuir para que houvesse mudança, evolução, estão a dizer o que os patrões mandam. Ridículo.
Não sei qual foi a conclusão da fábula, mas me preocupa a situação do pobre beija-flor, arriscando sua vida perto do fogo, cansado de tanto voar. Que fim teria levado a pobre ave ? Ninguém sabe. Posso garantir, entretanto que, se foi devorada pelo fogo ou morreu de cansaço, foi para outro lugar com a consciência tranquila, com a certeza do dever cumprido. Aliás, essa é a moral da história. Sei que é uma bobagem achar que essa gente está preocupada com isso. Importa quanto estão dando nas pesquisas, o faturamento, a liderança. O resto, eu, você, que se danem. É assim. Não há moral nessa história.
Breitner disse que o futebol brasileiro está dormindo, desde o último título, em 2002, na Coréia e Japão. Coincidentemente foi nesse período – mais adiante ou atrás, pouco importa – que as transmissões dos jogos passaram a influenciar diretamente nos campeonatos estaduais e competições nacionais. Até mesmo na seleção brasileira, hoje refém de patrocinadores, ela que durante muito tempo foi a paixão do torcedor brasileiro, motivo de orgulho. Foram muitos anos de achatamento da CBF, principal responsável pelo caos em que se encontra o nosso futebol, que já foi o melhor do mundo.
Vem aí o campeonato brasileiro, que essa gente, que você conhece muito bem, vai continuar dizendo que é o melhor do mundo, bla, bla, bla. Mentira, repito, eles querem vender o produto, massificar esse engodo, enfiar em sua goela um produto de segunda categoria. Que futebol é esse, onde se disputa um fla x flu em Volta Redonda para menos de 5 mil pagantes ? Que campeonato é esse, com tabela feita pela televisão para obrigar o torcedor a ficar em casa, manipulado para os quatro grandes fazerem as semifinais e dois – de maiores torcidas – ficam fora com duas rodadas de antecedência ?
Enquanto isso a molecada se liga nos campeonatos europeus, vestem camisa do Barcelona, Manchester, Real Madrid, Bayern, Milan e outros. Hoje qualquer adolescente, inclusive as meninas, escalam alguns times com mais facilidade que os seus preferidos brasileiros. Os jornais resistiram ao máximo, porém tiveram que se rendar às evidências e estão dando grandes espaços aos campeonatos alemão, espanhol, italiano e inglês, aos recordes de Messi e Cristiano Ronaldo. Mas custou.
A pouco mais de um ano da copa do mundo no Brasil, nossa seleção sofre um processo de esvaziamento nunca visto na imprensa mundial. Por aqui o descrédito do torcedor é impressionante. Nas bolsas de apostas a seleção canarinho, tão respeitada e idolatrada, aparece como segunda força, abaixo de Espanha, Alemanha e Argentina com suas seleções quase montadas, faltando definir uma ou duas posições. Quem diria.