SALVEM NEYMAR E O FUTEBOL BRASILEIRO

O menino Neymar começa a despertar novas atenções em torno de si, não exatamente pelo que joga. Mas o que dele pensam ex-atletas, craques consagrados, campeões do mundo? O depoimento do técnico Muricy Ramalho, do Santos, despertou um dragão adormecido, como se fosse possível manter-se alheio a tanta bagunça, como se o Brasil não fosse cinco vezes campeão do mundo nem estivesse se preparando para sediar a copa do mundo de 2014. Muricy tem razão em afirmar que Neymar deve ir para o futebol europeu?

Polêmico, irreverente, crítico, satírico, mas acima de tudo culto e independente, Paulo Cezar Lima, tricampeão do mundo aos 20 anos, foi craque excepcional, extra série. Estreou no Botafogo aos 18 anos (ainda juvenil), marcou três gols e deu o título ao Botafogo, contra o América, jogando ao lado de Rogério, Gerson, Roberto Miranda e Jairzinho, um dos maiores ataques do futebol mundial em todos os tempos. Aos 20 anos foi tricampeão do mundo jogando com Jairzinho, Gerson, Tostão e Pelé. PC não poupou o técnico do Santos.

Muricy é um oportunista. Quando vê que a corda está roendo ele pede o boné e vai embora. Ou quando tem proposta ou time para onde ir. Foi assim no São Paulo e no Fluminense. O que tem que mudar é esse negócio de time de guerreiro, raça, essas bobagens. Não vejo ninguém dizer “vamos jogar bonito”. É só jogar fechado. Quando eu pegava um jogador fraco ia pra dentro dele. Na minha época tinha o Pedro Paulo, Humberto Ramos, Altair, Moisés, Orlando Lelé, Fidelis, Brito, Morais, Fontana, só brabeira. Pegaram o Reinaldo, que ficou inutilizado com 20 anos. Mas nunca conseguiram me pegar. O sistema hoje é diferente, faz com que ele prenda a bola, por isso tem que ser inteligente, soltar mais a bola. Vai segurar a bola contra argentinos, toma porrada mesmo. Se for para o Barcelona, Real Madrid, Milan, desse jeito não vai jogar. Tem que saber quando driblar e quando soltar a bola. Ele é o cara, tudo em cima dele, que joga assim, é natural dele, depende muito de sua técnica. Se não mudar vai perdendo a paciência, perde o controle e acaba sendo expulso, como no jogo contra o Grêmio. Muricy é chorão. O Neymar tem que saber a hora de driblar e soltar a bola. O Jairzinho, Rogério, Roberto Miranda, tiveram contusões graves e o Carlos Alberto, ponta do Flamengo em 63, foi inutilizado depois de uma entrada violenta, contra o Bangu.

 

Jairzinho, o furacão que varreu o México na maior conquista da seleção brasileira em mundiais, formando com Gerson, Tostão, Pelé e Rivelino o melhor ataque da história do futebol mundial, ficou um ano recuperando-se de uma fratura no pé esquerdo. Sem a certeza de que voltaria a jogar. Foi uma entrada criminosa do volante Oldair, que jogava no Vasco. Eram tempos mais violentos. Jair não concorda com a posição do técnico do Santos, que prefere ver Neymar jogando na Europa, para fugir da violência.

– Ele foi infeliz nessa colocação, não penso assim. O país precisa desse tipo de jogador, com essa característica, qualidade e personalidade. O Neymar é o grande espelho no momento e a saída dele será muito ruim para o futebol brasileiro. Há um exagero nessa declaração. É a forma dele jogar, que não se vê há muito tempo no futebol brasileiro, com essa característica. Neymar e Lucas são os únicos que jogam para a frente, por serem habilidosos. Se bobear eles entram com bola e tudo. Não vejo maldade com ele, como andam dizendo. No meu tempo, sim. Hoje os marcadores são viris mas não são maldosos. Não há um volante nem um zagueiro maldoso, como antigamente.

 

Apontado por João Saldanha como titular para a ponta direita da seleção brasileira em 1966, na Inglaterra, o jovem Carlos Alberto jogou no Flamengo de 1961 a 1965, quando encerrou a carreira, aos 24 anos. Participou apenas de 110 jogos. Fez três operações no joelho esquerdo mas não se recuperou. Entradas criminosas – raras hoje em dia – fizeram mais uma vítima de um futebol romântico mas extremamente bruto com jogadores muito violentos.

– Profissionalmente vai ser bom para ele, que vai amadurecer. Aqui vão dar porrada nele mesmo. Se não der ele vai embora e faz o gol. Estão parando as jogadas se não ele bagunça. Mas não vejo violência como andam dizendo. Futebol é contato e hoje há mais velocidade as quedas são muito espalhafatosas, jogadores fingem muito, são manhosos, metidos a malandros. É normal parar a jogada, é o que tenho visto, até porque ele não teve nenhuma contusão grave por causa de falta. E que continue assim. No meu tempo batiam muito mais. Não concordo com Muricy.

 

Carlos Roberto era volante clássico, do grande time do Botafogo, onde fazia meio de campo com Gerson. Sabia os atalhos, onde buscava a bola sem precisar fazer falta. Jogou com Afonsinho, Ney Conceição, ninguém sabia bater. Eram estetas do futebol. Apreciavam e praticavam o belo como valor essencial. Jogou no Santos, na seleção, representada por oito jogadores do Botafogo, dando um dos maiores “olés” sofrido pela Argentina em toda a sua gloriosa caminhada pelo futebol. É o último técnico a dar um título ao Botafogo, no Rio. Está com Muricy, com relação à violência.

– Realmente, e não é só no caso do Neymar. Basta ver um jogo na Europa onde o número de faltas é bem menor. Sábado, o Barcelona ganhou do Sevilha, de virada, e fez a primeira falta aos 17 minutos do segundo tempo. Lá os jogadores tentam tirar a bola, visam a bola. Aqui param as jogadas a qualquer preço. Até quando o jogador adversário está cercado, num canto do corner eles derubam. Não é possível que os treinadores não vejam e coíbam isso ou eles são muito burros. Até na seleção o futebol está um caos, muito perto do fim. É preciso sentar todo mundo para discutir essa situação, que começa na base. O adversário tem que jogar, deixar o jogo fluir, aí é bom para todo mundo. Hoje está difícil ver um bom jogo, um time não domina mais o outro, como antes. Não dou razão ao Muriciy, se não, todo jogador bom que aparecer tem que vender. A coisa está feia, há muita falta. O jogador não sente vergonha fazendo isso ?

Ninguém jogou mais que Brito, na sua época, na sua posição. Uma barreira difícil de ser transposta, na categoria, quando precisava, ou na força, quando era necessário. Zagueiro como não existe mais nos dias de hoje. Todos sabem fazer faltas, raros têm a sua habilidade e força. Ou melhor, nenhum joga como ele.

– Gosto muito do trabalho do Muricy e do Felipão, idolatro mesmo, porque são francos e sinceros. Se o cara está jogando bem fica no time, gosto disso. Hoje há mutreta com jogadores, empresários, tem muita gente ruim. É uma mulambada só. Neymar é exceção mas tem que aprender muito. Tem jogada que não precisa cair e ele cai. O Messi só cai quando não dá mesmo para prosseguir. Leva a bola perto do corpo, outros deixam ela escapar, ficar longe, na frente. Acho que é a hora de vender bem, aproveitar agora que ele está em alta. Ele é bom, tem disposição, vai lá e não volta mais, só quando for para curtir a vida. No fundo, ele tem um pouco de razão, não estão deixando ele jogar. Contra o Grêmio ele foi expulso – merecidamente – não sei se foi má fé mas pisou no adversário e foi bem expulso. Vai fazer muita falta ao Santos, mas pode voltar para a seleção. Lá fora os caras são honestos não sacaneiam os jogadores.

Gerson foi o cérebro da seleção brasileira tricampeã do mundo no México, em 1970, não precisava dizer mais nada, só que foi um dos maiores do mundo na posição, em todos os tempos. Jogou no Flamengo, onde começou a carreira, Botafogo, Fluminense e São Paulo. E foi campeão em todos eles. Gênio da bola. Raros os que tinham a visão de jogo, em campo. Por isso comandou todos os times onde atuou. Jogava demais.

– Neymar tem que jogar aqui no Brasil e depois – consequentemente – vai pra lá. Ele, o Lucas. Mas tem que parar de reclamar, os grande são assim, mais perseguidos. Vão dão nos pernas de pau ? Tem mais que partir para cima dos caras. Jairzinho era assim, Paulo Cezar, Roberto Miranda, eles faziam isso, iam pra dentro. O Pelé quando jogava naqueles campinhos do interior era assim, os caras entravam forte e ele revidava. O Neymar tem que chegar mais forte. Na Europa ele vai levar também, como o Robinho, o Kaká. Tem que chegar junto e saber se defender, não adianta reclamar. O último cartão dele foi por reclamação, depois veio a expulsão, por um entrada que deu no Pará. A imprensa diz que ele está apanhando muito. O jogo é contato. E outra coisa, bola dividida é de quem chegar primeiro. Vai a Santos e pergunta para o Pelé o Zito como é que faz, eles vão falar pra ele.

Afonsinho tem alguma coisa de Neymar. Jogava tanto quanto ele, em funções distintas. Veio de Jaú ainda menino, para o Botafogo. Olhos agressivamente azuis e futebol de refinado bom gosto. Um prato cheio para as periguetes da época. Sabia o que queria, dentro e fora de campo. Venceu como magnífico artista da bola, curtiu a vida e abriu as portas para a libertação do jogador. Se não aproveitaram é outro capítulo. Como Neymar, também jogou no Santos.

– Acho que a coisa mais importante foi a posição do Santos que, com muito esforço, manteve o jogador aqui. Vai ter copa, olimpíada, os caras estão vindo, mas o futebol está impossível, não empolga, “tenebrosas transações”. A gente quer ver um jogo e não consegue, não atrai. Fala-se em dinheiro, esse momento social, ninguém está fazendo nada pelo futebol. Fala-se em futebol empresa, futebol é o produto, então que se faça um produto decente. Há muita ganância. Não me importo com a formação da seleção para a copa. A questão política da CBF é de assustar e o mundial está em cima. A violência existe sim, como lá fora, mas não é como aqui. Os caras estão batendo cabeça entre si, do mesmo time. Nesse campeonato houve três ou quatro cabeçadas de jogadores do mesmo lado, incrível. A coisa ficou fora de controle. Que batem a gente ta vendo todo dia. Existe arbitragem, tribunal e outros fatores, mas Neymar está sendo super explorado e ele não é de ferro. Quanto a cair, ai dele se não pular, já estaria quebrado e aí ficaria ruim para todo mundo.

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