Vale
Às vezes acordamos de madrugada com o estádio cheio e não conseguimos acertar um passe. Tudo frutos de noites e madrugadas passadas em claro nas concentrações, imaginando uma série de jogadas que nos levariam à seleção, mas que todas as bolas foram enviadas no sentido contrário, os beques chegaram antes e o goleiro adversário tratou de espalmar os nossos sonhos para escanteio. As noites seguintes aos clássicos são igualmente passadas na vigília, remoendo a chegada atrasada no cruzamento que passou dois passos à nossa frente na cara do gol, martirizando-se frente aquela entrada desleal que lhe enviou para o departamento médico, no seu melhor momento, quando poderia ter saltado milésimos de segundos antes do Guiñazu.
Neste momento, nas finais entre Vasco x Flamengo, podemos assistir um exemplo vivo de quem ainda não conseguiu se livrar dos fantasmas da vida esportiva, tão breve e intensa, e que ninguém teve a coragem de lhe lembrar que já parou. Adilson Batista, técnico do Vasco, acha que ficar ali pertinho do gramado, gesticulando para todos os lados, ensinando até a batida de um mero lateral como se fosse técnico de escolinha ou seus jogadores sofressem qualquer distúrbio neurológico, é uma maneira de atenuar sua precoce retirada de cena. Ao suar aquela camisa mais que seus jogadores porque está acima do peso, não por percorrer a mesma distancia do Pedro Kem, Adilson tem nos passado o maior dos constrangimentos.
Porque não foi assim que o Telê Santana e Evaristo de Macedo, seus grandes mestres, o ensinaram a se portar fora de campo. Eles agiam como um grande diretor teatral: ensinavam durante a semana, e deixavam seus atletas livres no palco do Maracanã para criar situações inusitadas, que os fariam crescer, assumir posturas diante do imprevisto, criar uma liderança que emergiria pelos seus próprios pés. Depois, no intervalo, fariam como Tim, o estrategista, recolocaria as peças nos lugares, as substituíria se fosse o caso, e voltariam todos para uma nova e intrigante batalha.
Adilson só foi o maravilhoso zagueiro que serviu ao Grêmio, a seleção brasileira, porque não encontrou nenhum mestre descontrolado à beira das suas atuações, teve liberdade para exercer um dom que precisa da confiança de quem senta, como Mourinho, ao lado da comissão técnica, dos reservas, aguardando um momento de colaborar. Não de intervir. Por favor, Adilson, senta naquele confortável banco e deixe seu meio campo pensar. Deste jeito, à beira de um ataque de nervos, aqueles carrinhos do seu argentino vingador, recheado de cartões amarelos, pode se tornar um cartão vermelho na respeitosa relação treinador-jogador. Nem Telê, nem Evaristo, merecem receber de um pupilo tão confusa interpretação da arte de treinar e comandar uma equipe de futebol.
José Roberto Padilha é jornalista, ex-atleta do Fluminense, Flamengo, Santa Cruz e Americano, entre outros.