O BONDE DO CHORORÔ

Desde meus tempos de criança, quando ia aos estádios levado por meu primo José Paulo, para ver os jogos do Vasco, já ouvia os primeiros xingamentos às mães daqueles pobres infelizes que entravam todos de preto, já condenados antes de cometer qualquer erro.  É assim a vida desse pessoal que, não sei por que resolve entrar numa carreira tão ingrata  e estressante. Devem ganhar muito bem, pensava, na minha santa inocência infantil.  Fui crescendo e passei a ir aos jogos sozinho ou com amigos do bairro. Era assim e não sei porque mudou. Sou do tempo em que o Ramalho entrava com seu talo de mamão e fazia um som inconfundivel, na arquibancada, lado direito, sempre aplaudido. Não havia torcida organizada e a gente podia ir aos estádios sem medo.

O tempo passou mas a minha paixão pelo futebol não. Ao contrário, aumentava a cada dia  e passei a frequentar o outro lado da arquibancada, “comprado” por meu saudoso tio Chico, que me deu uma camisa toda branca, com um escudo vermelho e preto, lado esquerdo do peito. Comprada na feira de Rocha Miranda, segundo ele. A essa altura Dida, meu primeiro ídolo, já “fazia minha cabeça”. Rolavam os últimos anos da década de 1950 e o “rolo compressor”, como era chamado, com certeza arrastou muita gente para aquela que  ganharia o nome de “Nação Rubro-Negra”, além de mim.

Não sei se xinguei a mãe de algum árbitro. Possivelmente não. Tinha dó daquele sujeito que pisava o gramado como se estivesse entrando numa arena para servir de refeição para os leões. Era essa a imagem que eu fazia daqueles pobres coitados. Não lembro, claro, mas ali deveriam estar Mario Vianna, Alberto da Gama Malcher, com quem eu trabalharia anos depois, no rádio, Amilcar Ferreira, José Gomes Sobrinho, José Aldo Pereira, Antonio Viug, possivelmente Armando Marques em início de carreira e outros que não lembro.

Um pulo gigantesco no tempo e me vejo mais revoltado ainda com o massacre que os homens de amarelo – pelo menos uma mudança – estão sofrendo. O que me dá a certeza de que nada vai mudar, nem daqui a cem anos. As regras mudaram, os uniformes também, os treinamentos tornaram os jogadores super atletas, a bola “corre” mais que suas “irmãs”  do passado, os campos ficaram “mais velozes”, quase tudo mudou. Menos o conceito covarde de que toda derrota tem como culpado o árbitro. Sempre ele.

A figura do comentarista de arbitragem parecia ter vindo para tornar as coisas mais amenas, com esclarecimentos que pudessem orientar o torcedor a ter uma postura menos irascível. Não foi bem assim e acabou formando uma grande confusão na cabeça dos espectadores e ouvintes. Cada vez ficam mais confusos com as próprias  conclusões dos “ex” , que na verdade não esclaressem nada. Forçados a “agradar” a praça para onde o jogo está sendo transmitido, ou tender a agradar os times grandes, a imparcialidade escorre pelo ralo como uma chuva fora da estação.

Foi assim com Sandro Meira Ricci, de Brasilia, que apitou o jogo do Flamengo contra o Ceará, quando o “mais querido” foi eliminado da Copa do Brasil, quatro dias depois de se tornar campeão invicto no campeonato carioca. Uma expulsão, do zagueiro Ronaldo Angelim – corretíssima, por sinal – levou Sandro do ceu ao inferno em segundos. Esqueceram-se  que o Flamengo fez 2×0, fora de casa, o que lhe garantiria a classificação, e deixou o Ceará empatar ainda no primeiro tempo. Queixam-se os “defensores” do Mengão, de um penalti não marcado. Ora, um penalti ? Foi por isso que o time foi eliminado ?  Acho muito pouco, até porque esse tipo de lance é interpretativo.

Mais assustador de tudo foi a imparcialidade da midia, que pôs na conta do árbitro brasiliense a culpa pela eliminação do time carioca. Todas as vezes que o Flamengo perdeu uma partida ou um título fortam causadas pelos árbitros ? E as vitórias obtidas com um falha do apitador ou seus auxiliares foram contestadas, alguém reclamou ? Não. Absolutamente ninguém. Não sei quando isso vai parar. Talvez quando os grandes do Rio construirem seus centros de treinamento ou suas arenas, seus estádios e ponham dentro de suas camisas jogadores de qualidade. A torcida está querendo time, não chororô.

4 thoughts on “O BONDE DO CHORORÔ

  1. Parabéns pelo blog Iata está muito bom. Tenho indicado para o povo aqui de Pomerode.
    Quando vai aparecer por aqui, para acompanhar o amador aqui. É quase uma Bundesleague, com a torcida falando em alemão.
    abraço e sucesso aí com o blog

  2. Iata, você é o único flamenguista da mídia que não é insuportável. Ouço-o todos os domingos no Bola em Jogo e sempre falo para a minha mulher, que também é flamenguista: ” Tá vendo, a pessoa pode torcer pro Flamengo sem distorcer a realidade, como a imprensa inteira faz”. Um exemplo disto foi a VERGONHOSA participação do (…), afirmando que o gol do Geraldo tinha sido o maior escândalo da história do Engenhão, quando todo o mundo viu que o toque do jogador foi involuntário. Parabéns, Iata, infelizmente só agora descobri o seu blog e o acompanharei religiosamente.

    1. Obrigado pela força, Fernando. Continuem prestigiando o Bola em Jogo e desculpe omitir o nome do colega.
      Continue com as críticas, tão importantes quanto os elogios, também aqui no blog. Saudações.

  3. Iata Anderson:

    Muito bem dito! Como ja nao se fosse insuportavel ouvir os comentarios dos “comentaristas” da Globo, com raras excecoes do Junior e Caio, agora temos que ouvir “ex-arbitros” repetirem as besteiras que eles faziam em campo. Entendo a sua simpatia pela classe, mas a incompetencia desses “profissionais” e gritante. Antigamente os caras erravam no calor do jogo quando tinham que tomar uma decisao em fracoes de segundos. Agora, os caras veem o replay cinco vezes, super camera, high definition, e ainda erram! O pior…continuam recebendo para isso! Se eu errasse tanto na minha profissao como esses caras erram eu com certeza estaria desempregado.

Deixe um comentário

O seu endereço de e-mail não será publicado. Campos obrigatórios são marcados com *