A sorte anda na marca do penalty

Antigamente, disputa de penaltys era uma loteria. Uma questão de sorte, diziam locutores e jornalistas esportivos. E de controle de nervos, Luciano do Vale acrescentava. Dos 7, 15 m a disposição de um cobrador que pode ajeitar a bola à sua feição, do outro lado se colocava um pouco treinado guardião a cobrir apenas ¼ daquela imensidão. De cada dez penaltys batidos nos anos 70, apenas um era defendido. Em 1972, nas Laranjeiras, havia um tanque de areia onde se atiravam após os coletivos Félix, Jorge Vitório, Roberto, Jairo e Nielsen, que pediam nossa ajuda para chutar bolas em sua direção. Agora, no campeonato brasileiro de 2016, tudo mudou. De cada dez execuções, quatro são defendidas pelos goleiros. E não foi a sorte que aumentou. Foi estudo, especialização, trabalho e dedicaçã ;o que se incorporou aos seus  treinamento por parte de um estudioso e precursor deste inegável avanço profissional: Raul Carlesso.

Membro da Comissão Técnica de 1970, oriundo da Escola de Educação Física do Exército, Carlesso voltou, quatro anos depois da Copa da Alemanha, impressionado com o goleiro da sua seleção, Sepp Mayer. Que publicou um livro denominado “Aprenda com o melhor goleiro do mundo” com seus métodos de treinamento. Entre eles, jogar  tênis. E deixou entre outras lições: “se acerto aquela bolinha, como não defender aquele bolão vindo em minha direção?” Até aquela data, os goleiros treinavam junto a mesma didática física e esportiva destinada aos jogadores de linha. Só o tanque de areia estava reservado para eles e sua percepção autodidata observada em saltos de pura intuição. Basta ver os gols tomados pelo Gilmar, em 58 e 62, do Leão, em 74 e do Félix, nos jogos do Tricampeonato, no México para constatar que realizavam suas defesas por vocação e instinto. E muito pouca orientação técnica  para defender suas metas. Barbosa, então, foi sacrificado por pular no chute do Gighia, no mundial de 50, do mesmo jeito que se jogava ao defender os juvenis do Vasco. E do seu time anterior de várzea. Era feelings próprio para exercer a profissão, não técnicas adquiridas para melhorar sua performance  diante dos ataques adversários.

Raul Carlesso tirou os goleiros do grupo de treinamento e os colocou a parte para aprimorar seus fundamentos. Fincou estacas com cones para simular zagueiros e ele mesmo batia os corners e faltas próximas á área. Outros cones eram colocados nas extremidades da intermediária adversária para treinar reposição de bola rápida. Ele mesmo puxar contra ataques. Aprimorar o chute e o domínio também foram importantes, afinal, na sua origem nunca é demais lembrar que “convidados” foram para agarrar no gol por absoluta incompetência de jogar na linha. Se eram excluídos na escalação, deveriam ser excluídos do grupo dos que utilizavam os pés e realizar, a parte,  todo um aprendizado. Além do mais os goleiros deixaram de viver naquela solidão porque passaram a ter um psicólogo, treinador, conselheiro e amigo juntos na figura do treinador de goleiros.

Hoje, quando um cobrador vai bater um penalty, ele sabe que vai ter à sua frente um profissional muito mais preparado. Que não salta mais a esmo para jogar a história daquela partida ao acaso.  E que na concentração passou a noite anterior assistindo todos os vídeos com as ultimas cobranças do batedor oficial e adversário. Enfim, não foi a sorte deles, goleiros,  que aumentou, muito menos o gol que diminuiu, foram eles que se tornaram mais competentes na prática e defesa do seu ofício.

Moral da História: a sorte acompanha quem, com trabalho e estudo,  diminui o tamanho das metas, e dos objetivos, que todo o azar adversário  assedia.

José Roberto Padilha é jornalista, ex-atleta do Fluminense, Flamengo, Santa Cruz e Americano, entre outros.

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