A NOSSA PORÇÃO CASILLAS

Aprendemos, e crescemos profissionalmente, como atletas muito mais nas derrotas do que nas vitórias. Mas só percebemos isto mais tarde, quando avaliamos o contexto da obra. O resumo da ópera. A vitória joga sobre todos no futebol uma névoa ilusória que nos anestesia em direção à perfeição. Vencemos no domingo e o que mais precisamos provar sobre aqueles que derrotamos? Então, na segunda, não aparecemos para treinar e o nosso comandante, igualmente relaxado perante as cobranças e também poupado pelo resultado, deu folga até na terça, quando retornamos calçando chinelinhos. Muitos tomaram o caminho do Depto. Médico, em busca de uma massagem por um mero tostão na coxa. Ao contrário, nas derrotas mal dormimos, mesmo diante das injustas. E acordamos cedo na segunda para melhorar os chutes a gol, aprimorar a forma física em busca de reverter, já na quarta, aquele mau resultado. Ao final de 17 temporadas de bola, não resta dúvida que aprimoramos mais nossos fundamentos, ficamos mais hábeis e preparados como atletas, e porque não, enquanto cidadãos, mais humilde, alertas, graças às derrotas.

Após os primeiros jogos da Copa do Mundo, principalmente no que envolveu os protagonistas da ultima final, Espanha e Holanda, não há como negar os estragos que a vitória fez à atual campeã mundial. Após a conquista, sua base continuou conquistando Eurocopas e Champions Leagues. Seu treinador, anestesiado pela glória, mal percebeu que aquela vitoriosa geração estaria chegando ao seu limite exatamente em 2014. Ao contrário, Holanda e Brasil, derrotados, saíram em campo em busca de renovação. Se o Brasil levantasse o hexa vocês teriam dúvidas que Kaká, Luis Fabiano e Robinho estariam escalados contra a Croácia? Que Maicon estaria em campo, não no banco? Que Oscar e Neymar seriam promessas pra 2018, não realidade em 2014?

A derrota fez a CBF sepultar a era Dunga. E iniciar com Mano Menezes um valioso laboratório que durou 2 anos, 39 jogos e envolveu mais de 62 cobaias. Graças a esta renovação, ao desejo nacional de se empreender mudanças na seleção, Neymar pode estrear na seleção com apenas 17 anos. E logo na estréia marcou seu gol contra os Estados Unidos. Se vencêssemos, Dunga reiniciaria a preparação com sua base titular e Lucio, e não Thiago Silva, seria o nosso capitão.

Agora, em plena competição, a Espanha descobre que Sérgio Ramos é o Lúcio, Xavi, Ronaldinho Gaúcho e que Casillas é … Júlio César . Este é a nossa porção passada que, embora derrotada, não foi renovada. Passou quatro anos a procura de emprego, em clubes menores, sem ser avaliada. Julio César não teve os reflexos, a saída do gol, o tempo da bola aferido em competições maiores, como Vitor e Jefferson, que disputaram libertadores e estão no auge de suas formas. Julio César, num momento anestésico de Felipão, é a porção espanhola que carregaremos durante a Copa. Então, que os deuses do futebol nos protejam quando Robben nos driblar para dentro e procurar um outro ângulo, que deveria estar fechado pelo selo Inmetro da renovação, não vulnerável e vencido, escalado pela acomodação.

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