RIO, RETIRO DOS ARTISTAS DA BOLA

Ontem, Ronaldinho Gaúcho. Agora, Seedorf. Amanhã, Riquelme. Já virou moda a cidade maravilhosa abrir seus portos para acolher ídolos às portas da aposentadoria. Jogadores que não mais alcançam desempenho para competições de alto rendimento. O roteiro é o mesmo: dispensados pelo Milan, aportam em aeroportos lotados, chegada de helicóptero para uma concorrida apresentação  e 24 horas de fama e  exposição num hotel de luxo, em Ipanema, até que um apartamento decorado seja encontrado na Barra da Tijuca para acolher sua imensa família.

O segundo capítulo é reservado à cotidiana agonia de quem recebe meio milhão de dólares, almoça no Porcão e janta no Fasano, guiando uma Ferrari que insiste em tocar o irregular piso que os leva a treinar num ninho escaldante de urubus. E que, no domingo,  os levará a atuar em irregulares gramados como do Bangú, do Americano, em Campos, sob a forte marcação de um cabeça de área do Nova Iguaçu, de canelas finas e com 17 anos, tirando-lhes  cada espaço pra sua ação e domínio.

O terceiro, após melancólicas atuações e seguidas contusões, mostrará a busca de um novo repasse, seja ele pro Atlético MG ou Figueirense, de quem mais se dispõe a pagar os salários que a Traffic jurou um dia honrar. Tudo para amenizar o prejuízo de quem, em menos de 12 meses, vai encarar um aeroporto mais modesto,com ares desconfiado e restrições, com recepções frias para atuar desacreditado numa outra freguesia. Diferente do Paul McCartney, que vai cantar para sempre porque a tecnologia sonora avança na igual proporção com que enfraquecem suas  cordas vocais, o artista do futebol precisa carregar até a linha de fundo  pernas e pulmões por gramados cuja dimensão lhes parece infinita.

No fim, com alguns quilos a mais e já confundidos com Tufão, resta aos nossos ex- ídolos realizar seu jogo de despedida, abrir uma fundação, receber repasse do Criança Esperança e, com sorte, serem nomeados nesta bocada conhecida como Autoridade Olímpica. Mas se o fim é trágico, mesmo sem a Carminha e o Max, e a novela reprisa os mesmos capítulos, porque nossos cartolas insistem em tornar seus clubes uma agência do INSS? Porque trocar a gloriosa Gávea, a histórica Marechal Hermes pelo Divino, cuja sede ilusória é a Avenida Brasil?

Talvez a resposta esteja na inversão de valores na atual estrutura dos nossos clubes: no lugar de investir nas divisões de base, aportam suas economias, aplicam seu patrocínio no departamento de marketing. Ampliam sua memória, inaugurando requintadas salas de troféus, expandindo suas butiques, com um olhar nas lembranças do passado e, cada vez mais, distante de revelar craques pro futuro. E entre os raros Cidinhos, Wellington Nem e Adryan que apresentam, fazem do futebol carioca uma festa instantânea, bonita e ilusória, que emolduram uma paisagem como numa grande queima de fogos de artifícios. Que iluminam  a imaginação dos seus torcedores na exata proporção com que apagam sua esperança de voltar a torcer por um time que tenha , acima de tudo, jogadores que eternizem o  seu presente. 

José Roberto Padilha é jornalista, ex-atleta do Fluminense, Flamengo, Santa Cruz e Americano, entre outros.

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