O SOCIALISMO DA BOLA

Rubens Galaxie, 61 anos, natural de Conselheiro Josino, Campos dos Goytacazes (RJ), chegou ao Fluminense aos 16 anos. Campeão carioca Juvenil, ajudou o clube a levantar a Taça Guanabara por três vezes e o estadual em quatro edições. Completou 25 anos de clube ao ser treinador das divisões de base e auxiliar técnico e treinador interino dos profissionais. Humilde, aplicado, um símbolo tricolor, trabalha hoje no Detran, cada vez mais esquecido.

 Porque toda vez que o Fluminense chega a uma final eles convidam apenas o Romerito. Ninguém aguenta mais o Romerito. Ou ele jogou sozinho? Pegou a bola na defesa, cruzou o campo inteiro e levou a bola até dentro do gol adversário? Fez como o César Cielo, pulou na água, nadou, nadou e foi buscar o ouro sozinho?

Muitos esquecem que o futebol é um esporte coletivo. Mas quando é o Botafogo que está na vitrine, chamam o Maurício pro camarote da televisão. Mas e o Mendonça, o Ademir, o Sérgio Manoel, não foram importantes em cada conquista? Ninguém aguenta mais o Maurício.

Nada é pior para um ex-atleta do que o ostracismo. Ser barrado no portão social por um chip sem memória, não ser lembrado nos corredores para provar, orgulhoso, ao neto que o acompanha, que aquela foi um dia a sua casa de shows.

Porque nenhum deles pediu para ser idolatrado, dar autógrafos, contribuir, com a luta do Rubens, a classe e maestria do Mendonça, o incansável futebol do Sérgio Manoel, para tornar a segunda feira de tricolores e alvinegros mais feliz e produtiva. Romerito, Maurício, o Assis de 85, Renato Gaúcho de 95 foram rotulados e empalhados com o tal símbolo. E tristes são os símbolos que empanam o brilho de outros guerreiros, coadjuvante de tantas conquistas.

Mas existe uma esperança. Ela se apresentou domingo, em Recife, enfrentando os uruguaios. A esperança de todo atleta esquecido tem um nome: seleção espanhola. Ela não tem monólogos sobre o palco, apresenta um elenco no campo. Nada de Ben-Hur, Ivanhoé, El Cid. Jogam coletivamente como nenhum outro na história do futebol. Condicionados a dar dois toques na bola envolvendo seus adversários, no seu esquema socialista ninguém corre com ela, atordoam os adversários com a precisão de deslocamentos, passes de perto e precisos, até que um deles, seja Xavi ou Pedro, Piquet ou Iniesta, partam em direção ao gol. No time espanhol não tem o Romário símbolo do Tetra, o Pelé de 70 que ofuscou o Gérson, Clodoaldo, Tostão e Rivelino. Um outro Ronaldo para ser arroz de uma festa que esqueceu da importância do Rivaldo na conquista do penta.

A Espanha, diferente do Barcelona que tem o Messi, é a ultima esperança dos elencos esquecidos. No seu esquema, não há estrelas, todos são planetas orbitando sobre um campo cujo brilho é a bola, que valorizam sua guarda, lhe dão carinho e redistribuem igualmente entre si a sua posse. Quando levantam títulos, se tornam campeões mundiais, deixam a marca da coletividade estampada acima da individualidade. Além do espetáculo que é assisti-la jogar, hão de deixar, como precioso legado, não o fim de cada herói, mas o começo de um reinado onde todos são iguais e receberão justas homenagens. Perante a glória e a história.

José Roberto Padilha é jornalista, ex-atleta do Fluminense, Flamengo, Santa Cruz e Americano, entre outros.

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