CARTA DE UM MILITANTE OFENDIDO

Bom dia, Presidente Dilma. E parabéns pela sua reeleição. Moro em uma cidade operária, Três Rios-RJ, de características industriais, metal-mecânica, pólo comercial, e com mais empregados que patrões, era de se esperar que o Partido dos Trabalhadores alcançasse por aqui 64,54% dos votos válidos a seu favor. Mas um fato diferente, desagradável, aconteceu nestas eleições. Esta é a razão maior por que lhe escrevo. Desde 1987, quando me filiei ao PT, tenho saído pelas ruas com minha bandeira vermelha com estrela branca, já um objeto meu de estimação. No começo, entendiam e respeitavam minha opção ideológica, embora não fosse eleito em nenhuma das vezes em que coloquei meu nome à disposição dos eleitores. Idealistas para alguns, causa perdida para outros, pouco importa, foi a maneira com que encontrei para manifestar minha opção político-partidária. Alguns chegados até diziam, após 8 eleições presidenciais, que nossa bandeira já fazia parte do cotidiano das urnas. Mas este ano, pela primeira vez, fomos ofendidos ao transitar com ela pelas ruas, embora a legislação continuasse a permitir manifestações pessoais e silenciosas dos eleitores, como camisas, broches e bandeiras. Um cidadão, dentro de um carrão preto, cheio de crianças no banco de trás, abriu sua janela, abrindo mão do seu ar condicionado que não nem pensa em dividir com os descondicionados das classes menos favorecidas, e berrou em minha direção: “Vai se ferrar seu petista de merda!” Outro, na velocidade da sua irracionalidade política, que não respeita a opção contrária de cada outro, berrou do outro lado da pista: “Seu terrorista! . Corrupto!. Ladrão!” Me senti, na hora, desconfortável, como um monge que ao sair de um mosteiro após longa vigília, vê alguém lhe ofendendo pelos erros de um dos seus: “ Seu Pedófilo!”.

Pela primeira vez, em todos esses anos, confesso, tive receio de seguir adiante pelas ruas desfraldando minha bandeira. Com o escândalo do Mensalão, da Petrobras, a mídia colocou sobre nós, militantes petistas, um selo completamente oposto à nossa trajetória de luta. De que adiantou tirar 32 milhões de brasileiros de miséria, deixar pela vez primeira o quadro de fome da ONU se as manchetes de O Globo, sempre contrária às nossas conquistas, ligavam nossa estrela aos escândalos? Demos casas a milhares de famílias, universidades e SISUS, PRONATECS e FIES para nossos filhos, importamos médicos para cobrir um déficit de 42 mil desassistidos, em lugares que a burguesia de branco jamais quis colocar seus pés calçando Mr. Cat no barro, se a Veja só focava em denúncias sobre a Petrobrás? Por isto, Presidente Dilma, peço-lhe, em nome da nossa história ilibada de luta: crie o Programa Bolso Íntegro do Servidor. Um programa voltado aos funcionários públicos, nomeados ou concursados, petistas ou coligados, de empresas públicas, estatais, que sejam obrigados a viver apenas dos seus rendimentos. Rastreados 24 horas pelo portal da transparência. Monitorados pela Receita Federal. Todos nós brasileiros sentimos, nesta eleição, que a corrupção é fome da vez, eleita pelas ruas o câncer maior de nosso país, o vírus ebola que corrói todas as conquistas da nossa recém democracia.. O Programa Bolso Íntegro do Servidor, no momento em que só destinar à conta do político proventos do seu próprio trabalho, não ofender o trabalhador obrigado a se virar com os rendimentos do seu mínimo salário, será a vacina que devolverá à classe política o respeito que ela precisa para tocar o país. A corrupção como foco eleitoral, além de impedir oportunidade de debater ideias, foi capaz de transformar adversários em inimigos, questionar a inteligência de heróis brasileiros, sempre esquecidos como os nordestinos, afastar em uma mesma casa pais dos seus filhos. Tornar amigos, inimigos. Neste ponto, todos perdemos. Mas se vencermos a corrupção, todos venceremos. Boa sorte. E conte comigo. Sempre.

José Roberto Padilha é jornalista, ex-atleta do Fluminense, Flamengo, Santa Cruz e Americano, entre outros.

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