Carta Aberta ao TJD

Talvez por abrir nossos tabloides e só encontrar más notícias, nós, brasileiros, já estejamos com o caos embutido em nossas vidas. A gente lê os jornais pela manhã, se indigna e vai trabalhar para na volta, ficar sabendo que o ônibus que despencou na Av. Brasil, matando 7 pessoas, jamais teve seu tacógrafo vistoriado pelo INMETRO. Que além do homofóbico Deputado Marco Infeliciano “cuidar” dos direitos humanos, o presidente da outra comissão, a de tributos e finanças, João Magalhães, responde a cinco inquéritos relativos por crimes praticados contra o sistema financeiro, peculato, tráfico de influências e corrupção

Bem, vocês são juristas do direito esportivo, mas é por isto que estou lhes escrevendo. Vosso tribunal terá, na próxima terça-feira, uma oportunidade histórica de fazer valer a justiça, breve que seja perante o caos, ao contrário das figuras acima que deveriam zelar por nossos direitos humanos, tributários e financeiros. Na próxima terça-feira, na sede do TJD-RJ, na Rua do Acre, centro da cidade do Rio de Janeiro, vocês irão julgar o atleta Seedorf, do Botafogo FR. 

Gostaria de apresentar, em sua defesa, algumas considerações: se o local do delito, o campo do Bangu AC, é cheio de buracos e impróprio para atletas do nível do réu exercer sua profissão, porque deixaram que ele atuasse ali? Segundo: se quem o penalizou, o desconhecido juiz da partida, realizou a mais confusa arbitragem do estadual , por ela foi sumariamente afastado pela FERJ e nunca mais foi escalado, como ter a súmula preenchida por ele como única sumula do julgamento? Fora as atenuantes em prol de um atleta que em mais de 500 jogos, em diversos países, apenas uma vez foi convidado a deixar o campo de jogo. E por reclamação, jamais por violência.

Estamos, excelentíssimos magistrados, carente de ídolos. Daqueles raros, como Guga, Éder Jofre, Senna, Giba e Zico que se tornaram referência dentro e fora de seus palcos. Que além de nos brindar com impecáveis atuações, não as empanaram com maus exemplos, pelo contrário, se tronaram referência para seguidas gerações. No local de sem enfurnarem em boates e inferninhos para comemorar efêmeras conquistas, difundiram e qualificaram suas modalidades cuidando de sua imagem e abrindo fundações, escolinhas, caminhos do bem.

Clarence Seedorf desde que chegou ao país, trazendo na bagagem uma técnica que desde Gérson e Ademir da Guia não desfilava por nossos meios de campo, tem sido um belo exemplo para todos os amantes do futebol. Desfila uma humildade que nossos craques perderam e uma dedicação aos treinamentos que os que atuam no Rio, sob a alegação de tantos e belos atrativos, não conseguem cumprir. Penalizá-lo, neste momento, seria punir a mediocridade que paira sobre o futebol brasileiro, que atingiu seu clímax quando um cidadão que apoiou a tortura passa a presidir o seu destino.

Qualquer punição a Seedorf, menor que seja, aplicada por vossas excelências, irá na contramão dos abaixo conclamados que o país tem feito a Luis Felipe Scolari para convocá-lo. Naturalizado, daria o equilíbrio que nossa seleção precisa, devolveria a confiança dos valores morais e éticos que a nação perdeu, em todas as esferas, além de mostrar ao mundo esportivo que adotou vários de nossos craques em suas seleções enquanto éramos os melhores do planeta, que também somos capazes de ceder nosso manto verde-amarelo a este messias que o destino nos enviou, no exato momento em que ocupamos a modesta 6ª colocação no ranking da FIFA.

Sou tricolor de coração e poderia estar feliz se o punissem às vésperas das semifinais do estadual carioca. Sem ele em campo, o título seria muito mais fácil. Mas antes, amo o meu país, o direito e o futebol. E é por eles que lhes peço: absolvam o Seedorf. Caso não encontrem amparo nas frias leis penais desportivas, que criem e utilizem a jurisprudência de cotas desportivas internacionais. Que importa se os meios fizerem justiça ao fim desta história?

José Roberto Padilha é jornalista, ex-atleta do Fluminense, Flamengo, Santa Cruz e Americano, entre outros.

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