SAUDADES DO DUNGA

É tanta correria, tantos ofícios  percorridos para valer por um, que não temos mais diálogos. Pobre Platão. Temos exercido miniálogos durante o dia porque ninguém tem mais tempo de ser ouvido. Ou parar para ouvir alguém. Nestes quinze segundos espremidos de expressão, estourando porque tinha uma fila para comprar o pão atrás de mim, minialoguei agora cedo com o Sandro, com o homem que anotava o bicho, o gari que varria a esquina e a Aninha que se dirigia a sua aula de ginástica. E o repertório foi se adaptando e encurtado junto: “Bom dia!”. “Que calor, hem!” “E a Lava Jato, pegou mais um!”. E, por fim, o campeão dos miniálogos: “E a seleção brasileira, hem?”

Falar mal da seleção brasileira e do governo é um direito adquirido pelo povo brasileiro ao longo da sua sofrida história. O Temer tem feito a sua parte, mas  e o Tite? Com ordem de quem assume, ganha de todo mundo e nos rouba este sagrado direito? “Quanto foi contra o Uruguai!”, perguntei sexta-feira ao meu porteiro antes de pegar o elevador. “Ganhamos!”. “Que saco!”. E o elevador subiu em silêncio. Sem críticas, tolhidos em seu repertório e emudecidos.

Desse jeito Tite de ser, vai cair a audiência dos jogos da seleção. E poucos irão aos estádios porque os resultados serão notícias que não alimentarão nossas frustrações. Poucos se postarão frente as bancas de jornais. Já imaginaram o Datena sem a cidade de  São Paulo alagada, carros boiando e o helicóptero, como um abrute mecânico, sobrevoando e pregando os olhos dos curiosos nas telinhas pelo Brasil? Vamos perder a emoção das nossas incertezas, conviver com a razão que cerceia palpites de toda a desordem e, a continuar assim, certinha, jogando deste jeito sem o Marcelo dá um só pontapé no argentino, o Neymar provocar o paraguaio e ser expulso, nossa seleção vai deixar de ser paixão. Seleção vai virar religião. Com todo o respeito.

Sérgio Porto, nosso Stanislaw Ponte Preta, dizia na balada dos anos 70, embalados pela cadência da Bossa Nova, da garota de Ipanema que passava toda linda, cheia de graça a caminho do mar, que o maior chato é aquele que você dá bom dia e ele para para lhe explicar. Bem se é assim, estou com saudades do chato e da Nara Leão, com raiva do batidão que acelera o passo, a programação, e, acreditem, com saudades do Dunga. Uma boa derrota dá assunto, não faz mal para ninguém e ainda nos classifica. Bom dia. E o tempo, hem! Que calor!

José Roberto Padilha é jornalista, ex-atleta do Fluminense, Flamengo, Santa Cruz e Americano, entre outros.

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