A Mulher, o Mito e a Manhã

Federer x Djokovic é um destes presentes que só o esporte é capaz de lhe proporcionar em um domingo pela manhã pós Ayrton Senna. Depois do nosso maior ídolo, não passou mais valer a pena trocar uma caminhada em um dia tão bonito e ensolarado para esperar que o Hamilton quebre. Que o Rosberg colida. Que o Bottas tire o pé da bota para nossa bandeira herdar um lugar antes cativo, hoje distante,  no pódio da F1. A grande final em Wimbledon teve de um lado uma lenda viva do tênis, talvez o personagem que incorpore melhor esta expressão: Roger Federer. Do outro, o atual número 1 do mundo, um sérvio alto e esguio, que parece uma máquina construída para devolver, e muitas vezes se impor, a toda a magia desferida do outro lado da rede: Novak Djokovic. Era a perfeição de um lado, o herdeiro da perfeição do outro a nos deliciar com momentos de pura arte, pintada ao vivo pelas raquetes de dois gênios do esporte.

A cada devolução impensada, bolas trocadas que quicavam na ultima linha, conclamava  os filhos para sala. Cada ace alcançado, implorava pela presença da esposa, sobrinhos, quem mais estivesse ao alcance da telinha para não perder lances de uma exibição que dificilmente será reprisada. E ficava imaginando a razão, e a motivação, para um desportista como Roger Federer permanecer tanto tempo praticando um tênis de tamanho nível enquanto tantos, Gustavo Kuerten inclusive, despencam do ranking da ATP poucos anos depois. De repente, a tevê, entre tantas tomadas de intervalo exibindo o mais variado naipe de estrelas, milionários e artistas presentes, dá um close no rosto de Mika Federer.  Estava lá a explicação desta longevidade: a expressão serena de uma mulher que se tornou esposa, que antes foi noiva, um dia namorada. Aquela que ralou junto na subida e não foi trocada pelos milhares de dólares e ofertas que iam chegando. Basta recordar daquelas modelos que encantam o mundo com seus rostinhos alvos, cabelos louros, olhos azuis pelas tribunas de Roland Garros, enquanto seus aspirantes a astros exibem seus quinze minutos de fama pelas quadras. Modelos que os fazem circular pela balada, segui-las pelos holofotes e passarelas Grand Slam afora, quando deveriam, pelo esforço de atuar em alto rendimento,  ir para o hotel descansar o corpo para não sucumbir no torneio seguinte.

Por trás de um grande homem existe uma grande mulher. Talvez esta seja a frase mais infeliz e injusta da história da humanidade. Quando está ao lado de um homem tão grande que a mereça, a mulher, não a Maria Chuteira, a Rita Tatame, a Lucinha Raquete da fase boa, é capaz de manter seu foco. Ser fator de equilíbrio. Levá-lo a longevidade. Mais tarde, em meio ao caos de um Flamengo perdido e confuso diante do Corinthians, as imagens saem do gramado e alcançam nas tribunas do Maracanã outro grande exemplo. Zico e sua namorada, noiva e mulher, a Sandra, cercados de filhos e netos que são as razões maiores que o fizeram Zico. Não há mesmo como ser unanimidade  no esporte sem ter o ombro, o apoio e a segurança de uma parceira de berço que jamais o deixará tirar o foco. Perder pelos caminhos tortuosos da fama a força que impulsiona sua arte. Manter vivo seu talento de olho na bola. E na bolinha.

Então, me perdoe o sol lindo desta manhã de domingo, minha bicicleta estacionada, tênis que nem deu tempo de calçar, mas Federer x Djokovic na final de Wimbledon, pelo espetáculo que proporcionaram, mereciam ocupar todas as colunas. Na frente do futebol, muito além dos Jogos Pan Americanos, em reverência a arte e beleza do esporte, da manhã e da mulher.

José Roberto Padilha é jornalista, ex-atleta do Fluminense, Flamengo, Santa Cruz e Americano, entre outros.

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