SEM HERÓIS, SEM ÍDOLOS

Nem imagino como seria minha vida sem ídolos. Acordava, ia para o colégio, jogava bola, mas a melhor hora era quando voltada da banca com o gibi do Fantasma, do Tarzan e do Super Homem. Suas histórias eram as que gostaríamos de viver, enfrentando e vencendo leões, jacarés, índios selvagens para depois subir pra cima daquela árvore e se jogar nos braços da Jane. Ou voar para a redação rever Louis Lanne ou reencontrar a Diana Palmer na oca dos pigmeus. 

Dia seguinte, na carteira ao lado, havia uma linda morena de cabelos encaracolados e não tínhamos um só super poder para impressioná-las. De vez em quanto marcávamos um gol no recreio, mas nossas Janes não apareciam por lá. Se não havia jacarés, tinha sempre um leão mais forte que a gente querendo bater em todo mundo, mas éramos pequenos e fracos para derrotá-lo e soltarmos aquele grito que fazia até a Chita tremer.

Passamos assim nossa infância, adolescência, crescendo ao lado daqueles ídolos, suas conquistas heroicas, suas belas mulheres. Nenhum deles se casava, deixava crescer a barriga, recorriam à Herbalife ou perdiam uma só luta para não despertarmos dos nossos sonhos. Idolatrá-los era um ritual que, acredito, herdamos dos nossos nativos antes que os jesuítas lhe apresentassem um Deus onipresente a todo mundo. 

Depois, amantes do esporte como somos, seguimos pelos campinhos de pelada os poderes do Pelé, do Gérson e do Rivelino. Os que jogavam tênis, colecionavam os feitos de Maria Esther Bueno e várias gerações se formaram atreladas ao sucesso do Guga. Quem jogava xadrez venerava Mequinho, os amantes da luta torciam por Éder Jofre e nas pistas, Émerson Fittipladi, Piquet, Senna trouxeram a paixão das tardes de domingo para mais cedo e vários autódromos foram reformados pelo país atraindo novos pilotos

No basquete tinha a Paula e a Hortência, e a modalidade cresceu ainda mais quando Marcel e Oscar derrotaram os americanos em Indianapolis. Tinha ídolo para tudo o quanto é esporte, mas só percebi que desapareceram quando tentava fechar, no domingo, o álbum da Copa com meus netos. Com a exceção do Neymar, não tem nenhuma carimbada, aquela rara como a do Zico, que em 82 valia mais que a banca inteirinha. Pelo que jogava, valia a pena sua busca, quanto mais demorava, mais o reverenciávamos. Hoje, dá pena depender da figurinha do Hulk. Com todo respeito, do Maxwell e do Robinho que nem convocado foi.

Aí a televisão nos informa que o Massa chegou em 8º, o Thomas Bellucci nem se classificou para Roma e que nosso voleibol, apesar de ganhar sempre, idolatra seus treinadores, que nem tocam na bola cuja magia atrai seguidores. Sem o Maguila que apanhava mas nos divertia, assistimos um basquete que insistiu até a ultima gota de suor com a Janete e o Marcelinho. Pistas de atletismo sem expoentes que só nos dão saudades de João do Pulo, Joaquim Cruz e Robson Caetano. 

Uma pena que roubaram nossos ídolos, aquele semideus que povoava nossos sonhos e deixava, lá no fundo, a esperança de sermos heróis e marcarmos o gol da vitória por um dia. Sobrou o Cesar Cielo, mas que edifica sua glória por décimos de segundos e mal há tempo de cativar seguidores. Neste domingo, restaram os jornais e fomos juntos conferir se sobrou algum. Só havia uma reportagem com o Felipão, e ele declarava que seu ídolo é Augusto Pinochet, o ditador chileno que fez por lá o golpe que nos custou tanto por aqui.

Melhor então levar meus netos pro parquinho, voltar às bancas e tentar encontrar um herói fictício para enriquecer suas vidas. Do jeito que a mediocridade impera, herói serão eles, Dudu e Felipe, que enfrentarão nesta Copa, talvez sempre, a dura realidade de crescer sem o fascínio de uma idolatria.

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